Foto de Alvaro Garcia, Jornal "El Pais"

O papel do silêncio em Tristan e Isolde


Querida Waltraud,

Fiquei "sumida" um tempo aqui do nosso "ponto de encontro", mas esta minha ausência, meu silêncio me proporcionou algumas inspirações...

Depois de tantas vezes me encantar com a música de “Tristan und Isolde”, encontro-me também encantada com os “silêncios” que tanto “falam” nessa obra.

Gosto de comparar o silêncio com o caos, pois ambos são as bases da criação. « O Caos é a terra que nutri o Cosmos », diz os grandes ocultistas. A união do Cosmos com o Caos produz a cada vez alguma coisa de novo, que não estava nem pré-figurada, nem em estado latente, é em algum nível o que chamamos de genialidade.

O Silêncio é o Caos do som, do Cosmos; a música é o “gênio”, fruto dessa união. O Silêncio, enquanto base para o som, é o ponto de partida para a música, determinando o início dos ciclos.

Esotericamente chamamos de “grande silêncio” a experiência do espírito que, ao deixar o corpo físico, deixando também toda “matéria” relacionada à desejos e sensações, encontra-se num estado de perfeita consciência, de grande calma, onde qualquer imagem ou sensação parecem apagarem-se, até mesmo a faculdade de pensar, porém, nesse estado o espírito sabe simplesmente que ele É, onde, sendo sustentado pelo Eterno, sua alma é preenchida por uma paz maravilhosa que ultrapassa toda inteligência.

O drama de “Tristan und Isolde” (Tristão e Isolda) é um drama de silêncio, mas também de segredo, o que dá beleza a esta obra.

As palavras “silêncio” e “calar-se” estão sempre presentes, seja o silêncio de Tristan em relação à Isolde no 1°Ato, não querendo falar com ela, seja o amor que Isolde escondeu mesmo de Brangaene, onde tudo é claro para Isolde, mas somente para ela, quando diz:

O blinde Augen,
Oh! Olhos cegos,

blöde Herzen!
corações néscios!

Zahmer Mut,
Espírito domado (de)

verzagtes Schweigen!
(o) silêncio desesperador!

Wie anders prahlte
De que outra maneira

Tristan aus,
Tristão abertamente bravateou-se,

was ich verschlossen hielt!
daquilo que eu mantive encerrado!

Die schweigend ihm
Àquela que, fazendo silêncio

das Leben gab,
deu a ele a vida,

vor Feindes Rache
guardando-o silenciosamente

ihn schweigend barg;
da vingança do inimigo;

was stumm ihr Schutz
Àquilo que a proteção dela

zum Heil ihm schuf ---
a ele proporcionou salavação -

mit ihr gab er es preis!

com ela, ele isto entrega (abandona)!


Seja também no momento de tomar o filtro, que Tristan ouve a “Rainha do Silêncio”, ou o majestoso dueto de amor do segundo ato que termina no silêncio do êxito, seguido do silêncio do Rei Marke ao descobrir os amantes quando Tristan diz que isto o rei não poderia entender, até seu ápice, “Liebestod”, a morte de amor, onde Isolde diz:


Höre ich nur

Só eu que escuto

diese Weise,

esta melodia,

die so wunder-

maravilhosa

voll und leise,

e sutil

Wonne klagend,

Deliciosa e lângida

Alles sagend,

Tão eloquente

mild versöhnend

docemente reconciliante

aus ihm tönend

que jorrando dele

in mich dringet,

se infiltra no meu ser

auf sich schwinget,

que dele vibra

hold erhallend

com doçura

um mich klinget?

E ressoa em mim?


E assim ela descreve esta experiência de viver o “grande silêncio”, onde a morte dá lugar ao amor, onde o espírito É e Isolde mergulha no caos, no silêncio, no hálito do Universo.

"Liebestod" em "Tristan und Isolde"... e Isolde ascende aos céus.

Sabe Waltraud, no momento tenho pensado muito no « Liebestod » de Tristan und Isolde (Tristão e Isolda).

Liebestod que significa “morte de amor”...Morrer de amor...será que realmente já paramos para pensar que coisa fantástica representa isso?

O “morrer” em Tristan und Isolde não está em relação com dor e sofrimento. O “Liebestod” é mais do que uma morte, mas um momento de transmutação, de entrega, de chegar ao fim de um ciclo, “consumar”algo que estava determinado. Eu ousaria dizer que Isolde não morre simplesmente, mas ascende aos céus! É o momento que Isolde desperta para os planos espirituais, ela “vê”, “ouve” o que os outros não percebem. Podemos mesmo fazer analogia com um processo iniciático.

Trazer os grande mitos para a nossa realidade atual (realidade que percebemos enquanto humanidade geral) acredito que seja nivelar a situação por baixo. Somos todos Deuses em formação, centelhas divinas, e os mitos vêem nos lembrar dessa condição (ver texto sobre mitos aqui). Entender simplesmente que Isolde morre para ficar com Tristan me parece muito pouco. Esta obra vêem nos mostrar que nós que devemos elevar nossa condição atual à condiçao ideal dos mitos, que existe uma forma de viver em Amor, de “romper” com as convenções, que a possibilidade de estar em harmonia com o Universo e comprêende-lo com toda nossa alma, os processos iniciáticos, estão abertos à todos aqueles que vivem em Amor. Amor com “A” maiúsculo, amor sem egoísmo, altruísta, incondicional, de espírito para espírito.

O Amor de Isolde e Tristan não é o “fim”, mas sim o “meio” para essa condição.

Para melhor “mergulharmos” na “Liebestod”, vamos desfrutar de duas montagens sensacionais que temos disponíveis em DVD. A montagem de Heiner Müller, em Bayreuth, em 1995 e a montagem de Patrice Chéreau, no Scalla de Milão, em 2007, ambos com Waltraud Meier como Isolde, natürlich!

A idéia desse texto não é discutir a respeito das montagens, mesmo porque ambas são maravilhosas, cada uma dentro de seu ponto de vista, mas simplesmente vejo na montagem de Patrice Chéreau uma visão mais humana e na montagem de Heiner Müller uma visão que chamaríamos talvez de “sobre” humana (lembrando que refiro-me especificamente a ária final, o “Liebestod”, que é o nosso tema)

Tive a oportunidade de assistir a montagem de Heiner Müller em video em um evento wagneriano em 2006. Curiosamente na época morava próximo à Igreja da Maria Madalena em Paris, a qual frequentava regularmente. E justamente pensando no lado sagrado da morte de amor de Isolde, me foi impossível não comparar a imagem do altar dessa igreja, que representa a ascensão de Maria Madalena (porém é uma imagem ambígua, parecendo também Jesus Cristo), com o final da montagem de Tristan und Isolde de Heiner Müller. Só posso dizer que estava nos céus depois de assistir essa maravilha! Quanto a imagem, vejam vocês mesmos! (sem querer comparar Isolde com a figura de Maria Madalena muito menos de Jesus, simplesmente a forma de "ascender", a forma "sagrada" deste momento)

Ai esta a cena final...

... e este é o altar da igreja...

Interessante, não?!!


Já a montagem de Patrice Chéreau, que é magnífica dentro de uma visão mais humana, assisti ao vivo a sua estréia em transmissão pela TV, e no momento do “Liebestod”, além de toda emoção, fiquei um pouco chocada! A idéia de derramamento de sangue na morte de amor me incomoda um pouco.


O sangue é o meio de expressão para o espírito em relação ao seu corpo físico. E derramamento de sangue esta diretamente relacionado com sacrifício. O maior exemplo que podemos ter é justamente o sacrifício de Jesus Cristo pela humanidade, através do sangue que escorreu no momento de sua morte; porém Isolde não se sacrifica, ela não morre por Tristan, nem pelo amor, mas sim de amor, de êxtase divino.


Isolde busca um estado de espírito para consumar o amor divino que ela conquistou, fruto do processo alquímico da transformação da paixão em amor que acompanhamos no decorrer da obra. Sendo assim ela encerra com as palavras: “nesta onda universal da respiração do mundo, eu mergulho, eu me afogo, inconsciente, êxtase máximo!”


E então podemos mergulhar junto com Isolde, aqui na montagem de Patrice Chéreau:


E aqui na montagem de Heiner Müller:

Amfortas e a ferida da humanidade

Em diferentes versões do mito de “Perceval”, a ferida do Rei encontra-se justamente na região sacral, ou seja, nos orgãos genitais. Em sua obra “Parsifal”, Wagner representa a ferida do rei Amfortas na região abdominal, justamente no “lado”. Uma possível interpretação seria a analogia da ferida de Amfortas com a ferida de Jesus Cristo. Porém Amfortas não é o “Redentor”, mas sim espera pelo Redentor.

Como vimos com a Annick de Souzenelle, as palavras “costela” e “lado” são a mesma palavra em hebreu. Eva foi feita, não da costela, mas do “lado” de Adão, representando o seu lado feminino, aquele que ele deve unir-se, tomar como esposa, para tornar-se um Ser completo.

Amfortas porta a ferida incurável no “lado”, pois não sabendo dominar-se, deixou-se seduzir, caindo do nível divino para o nível carnal. Mas por que Parsifal resiste ao poder de sedução de Kundry? Sendo o puro, tolo, inocente, Parsifal é ainda ingênuo, precisa de alguém que lhe indique o caminho do casamento místico, o casamento do masculino e feminino que deve acontecer no interior de nós. E quem mostra tal caminho é justamente Kundry, o feminino em si, lembrando à Parsifal a memória de sua “mãe”. O ser humano tem uma memória secreta o ensinando que seu destino divino é o casamento com sua “mãe das profundezas” , seu femino interior, devendo então buscar o equilíbrio entre seus pólos feminino e masculino. “Macho”, masculino, em hebreu significa “se lembrar” e “fêmea”, feminino, significa “recipiente que contém”. O ser humano, criado a imagem e semelhança de Deus, trabalha seu pólo masculino uma vez que se lembra da Imagem de Deus enquanto sua essência, partindo assim à conquista do seu “feminino” interior, a imensa reserva de energia que jorra da inesgotável e profunda fonte interior do seu Ser.

Partindo de uma visão simplista, Kundry seria a figura da “prostituta”; definição aceitável se partirmos do idioma hebreu, onde prostituta e santa são a mesma palavra! Pois Kundry nada mais é que o espelho que Parsifal precisa.

A pureza de Parsifal o permite ver essa dualidade em Kundry, tanto que seu destino é exatamente aquele indicado por Kundry: ele vai errar pelo mundo, encontrar todos os caminhos exceto aquele que ele procura, que é o caminho que leva à Amfortas, para poder curá-lo.

Em sua errança pelo mundo, utilizando apenas do poder curador da lança, ele é o Servo de todos, e através do Serviço, de uma vida pura, ele “conquista” seu lado feminino, seu casamento com o divino, podendo assim indicar o caminho para Amfortas, finalmente curando-o.

Lembremos que nós, enquanto humanidade, portamos a mesma ferida que Amfortas, caímos do nível divino para o nível carnal, onde dependemos também do “Redentor”. Conquistemos nossa pureza interior, através do amor, tornando-nos “Parsifal” para assim também não so aguardarmos pela redenção mas sim colaborarmos no alívio da dor da humanidade.

Porque se "confessar" à Waltraud Meier?

Desde que comecei com o blog há alguns anos atrás, o motivo sempre foi o amor e devoção pelas obras de Richard Wagner, mas sempre pensei que seria interessante eu “explicar” o porque das “confissões” serem justamente à Waltraud Meier...

na verdade são varios motivos... talvez seja em função da primeira vez que a vi cantar ao vivo em Paris (23/02/06) que senti que sua voz falava diretamente ao meu coração, e eu, ingênua, nem sabia que ela era simplesmente a maior cantora wagneriana dos nossos tempos (para mim, de todos os tempos!),mas depois disso só tinha uma certeza em mente “preciso ouví-la cantar Isolde!” e ai que começaram as inspirações dos textos...

mas talvez seja depois que assisti seu portrait, que a sensação que tive era que conversava pessoalmente com ela, pois parecia que o dvd respondia às minhas perguntas...

talvez seja depois da primeira vez que dei um livro para ela e ela respondeu: “mas como você sabe que eu me interesso pelo assunto?”...

talvez seja pelas influências astrológicas e vários pontos que temos em comun...

talvez seja, simplesmente pela pessoa fantástica que ela é... talvez ai vocês me perguntem “como você pode afirmar isso?”, simples: pela transparência que ela é, pela sua forma de viver os personagens em cena, pela sua forma humilde e discreta de ser, eu diria que é muito fácil saber realmente quem é Waltraud Meier...é só olhar em seus olhos, pois o brilho que vem de seu coração não a permiti “mentir” ou transparecer qualquer coisa que não seja seu coração, ou seja, sua alma... Em uma das cartas que entreguei à Waltraud dizia que ela é um ser humano que realmente vive a trindade do BOM, do BELO e do VERDADEIRO, que é exatamente a essência da musica de Richard Wagner... e acho que é isso, acredito que o próprio Wagner adoraria tê-la conhecido e se "confessaria" à ela também!

Para compartilhar isso com vocês preciso colocar esse trecho do seu portrait que sempre fala ao meu coração, pois sempre que assisto, mesmo sabendo quase “de cor”, sinto um "arrepio" de como se estivesse assistindo pela primeira vez... espero que isso não seja “violação de direitos autorais” pois meu interesse é sempre o mesmo: compartilhar com os amigos o que vem do coração.

E fica também o convite para quem quiser “confessar” algo também, seja a admiração pelas obras wagnerianas, ou pela Waltraud, ou pelos dois! (que é o mais provável!)

Deixem seus comentários!



Segue a transcrição do video: “Se me perguntam: porque Wagner tornou-se, de certa forma, “meu” compositor..., não posso dar resposta sucinta,... sem dúvida, nunca chegarei ao fim desta questão..., eu tento responder indo além da simples afirmação que apenas me interesso profundamente à complexidade da sua obra, que exige muito de mim mesma..., se tomamos apenas os aspectos psicológicos presentes na sua temática lírica, pode-se estudar a psicologia de cada personagem, decifrar a sua personalidade, pode-se abordar Wagner sob ângulos muito diversos, é possível consagrar a sua vida só a um aspecto, por exemplo a psicologia, a filosofia, ou simplesmente o texto, de um ponto de vista meramente técnico; pode-se estudar a orquestração, a linha mélodica, o tratamento da voz, e depois pode-se considerar todos os elementos juntos..., no que me diz respeito, acredito que seja uma reflexão infinita, tenho a impressão que nunca chegarei a resposta dessa questão..., espero que possa ter a chance de ter uma outra vida, assim poderei continuar a minha reflexão… e é exatamente isso que acho fascinante em suas obras..., se interrogar-me qual a minha opinião sobre os outros compositores de óperas, em comparação com Wagner, eles me parecessem ligeiramente simples..., as suas obras são magníficos, certamente, de melodias prodigiosas, que tocam-nos o coração, mas tal unidade eu encontro apenas em Wagner”

Nona sinfonia de Beethoven: “Alle Menschen werden Brüder” (todos tornam-se irmãos)

“Alegres como cavaleiros vitoriosos.
Eu vos abraço, ó milhões!
Lanço um beijo ao mundo inteiro!
Irmãos! Acima das estrelas do céu
Um Pai bondoso tem sua morada.
Prostrai-vos ante Ele, milhões!
Sentes teu Criador, Mundo?
Procura-o acima das estrelas do céu,
Acima delas Ele há de estar.”


Este final da Nona Sinfonia de Beethoven, do poema do magnifico poeta Schiller, é como eu vejo o trabalho de Daniel Barenboim juntamente com a orquestra West-Eastern Divan e todos que fazem esse projeto acontecer!

Recebi recentemente o DVD que foi gravado no dia 27 de agosto de 2006, no teatro filarmônico de Berlin, onde Daniel Barenboim rege esta majestosa sinfonia com sua orquestra contado com os solistas: René Pape, Angela Denoke, Burkhard Fritz e claro, Waltraud Meier!

Gravação na qual eu estava presente fisicamente, foi a primeira oportunidade que tive de estar junto dessas pessoas que fazem esse lindo trabalho de enviar uma mensagem de paz e amor ao mundo inteiro.

Foi uma verdadeira “Ode à alegria”, mais que uma experiência musical, uma experiência de união, de harmonia e solidariedade, onde todo e qualquer conflito, seja ele de raça, religioso ou politico, simplesmente não tinha espaço, pois ali eramos todos irmãos enquanto espíritos, seres buscando o real sentido da vida: o amor.

Acredito que esta ultima grande sinfonia de Beethoven realmente é o que podemos entender pelo signo de Aquario, e seus planetas regentes em mais alto nivel, Saturno e Urano.
Estamos nos preparando, enquanto humanidade, para a era de Aquario, o aguadeiro, aquele que derrama a agua pura sobre os homens, o que transforma os sere humanos em Humanidade. A palavra chave desta hierarquia é “AMOR UNIVERSAL”, fraternidade universal, é a paz que sempre buscamos arquetipicamente mas que nossas atitudes nem sempre correspondem à tal busca.

Tal fraternidade universal que sera a “nova raça” humana, que não são um ou dois povos que vão evoluir mais do que os outros, pelo contrario, a nova raça que sera a união de todos os povos, a mistura necessaria para se obter a verdadeira e pura essencia de cada raça, isso é o signo de Aquario.

Urano é um planeta “elétrico”, sentimos essa vibração de energia no 4° movimento da nona sinfonia, algo realmente querendo romper com todos os paradigmas indo diretamente a essência das coisas, isso é a energia Uraniana, um planeta progressista, intuitivo e que busca a liberdade .

Porém temos Saturno, que mesmo sendo o planeta da obstrução, nesta Sinfonia ele é representado da forma mais aquariana possível, ele é o Pai, Deus Pai que nos ama e que nos protege, tendo seu complemento no signo de leão (Sol como planeta regente), o filho, o Cristo, que sacrificou-se para salvar a humanidade, preparando nossos campos vibratorios para a Nova Era.

E disso tudo temos um judeu sob a batuta de tal orquestra, com musicos do oriente médio, sendo muçulmanos, judeus e cristãos, cantando com alemães, em uma das cidades de grande participação na segunda guerra mundial, com um publico vindo dos 4 cantos do mundo... mas ali, através da musica e da arte, nada disso importa, todos somos um, seres espirituais, vivendo em amor...e Waltraud confirma essa impressão pelo brilho radiante do seu olhar...

A união de Siegmund e Sieglinde e o Equinocio da Primavera

"Winterstürme wichen dem Wonnemond,
Vão-se, em maio, as tormentas do inverno;

in mildem Lichte
em meiga luz

leuchtet der Lenz;

fulgura a Primavera;
auf lauen Lüften

pelos ares temperados,

lind und lieblich,
amenos e meigos,

Wunder webend

operando seus milagres,
er sich wiegt:

ela se move:

durch Wald und Auen

por florestas e prados,

weht sein Atem,

sopra o seu fôlego;

weit geöffnet

amplamente abertos,

lacht sein Aug’.

seus olhos sorriem.
Aus sel’ger Vöglein Sange
No gorjeio feliz do pássaro,

süß er tönt,
docemente ela ressoa;

holde Düfte

adoráveis fragrâncias

haucht er aus:

exala pelos espaços:

seinem warmen Blut entblühen

seu cálido sangue floresce

wonnige Blumen,
deleitosas flores;
Keim und Sproß
entspringt seiner Kraft.
seu alento desabrocha gérmens e rebentos.

Mit zarter Waffen Zier

Com a beleza de tenras armas

bezwingt er die Welt;

ela domina o Mundo;
Winter und Sturm wichen
der starken Wehr:
vão-se as fortes defesas do inverno e da tormenta:
Wohl mußte den tapfern Streichen

A esses intrépidos ventos, bem devem

die strenge Türe auch weichen,

ceder também as fortes portas;
die trotzig und starr

eles, obstinados e rijos,

uns - trennte von ihm.

apartam-nos dela.

Zu seiner Schwester

Por seu irmão

schwang er sich her;

moveu-se ela para cá;
die Liebe lockte den Lenz:

o amor cortejou a primavera:
in unsrem Busen

em nosso peito

barg sie sich tief;

alojaram-se, ao fundo,

nun lacht sie selig dem Licht.

e agora riem-se, felizes, à luz.

Die bräutliche Schwester

Ao irmão noivo
befreite der Bruder;
a irmã liberta;

zertrümmert liegt,
was sie je getrennt;
cai por terra o que esteve a separá-los;

jauchzend grüßt sich

exultante, saúda-se

das junge Paar:

o jovem par:

vereint sind Liebe und Lenz!

unidos estão Amor e Primavera!
"

...é incrivel como a poesia desse trecho do libreto do primeiro ato de "As Valquirias" ja fala por si só!

Guardemos essa magia da poesia, mas aprofundemos em algumas mensagens místicas que essa ária incrivel vem nos mostrar.

Recapitulando brevemente, estamos na "segunda noite" da tetralogia de "O anel do Nibelungo", na ópera "As Valquirias" . Primeiramente, vimos que Wotan, o Deus que não consegue ser livre dos seus próprios acordos e tratados, criou os "Walsungs", raça formada da mistura de deuses com humanos, onde ali teria colocado sua esperança de liberdade. Tal esperança existe até o momento que Wotan é confrontado por Fricka, espírito do convencionalismo, que lhe mostra que ele que criou Siegmund, logo, ele é condicionado as vontades de Wotan, ou seja, Siegmund tambem não é livre...

Siegmund precisa romper sua ligação, seu "cordão umbilical" com Wotan para poder conquistar sua liberdade, desde que seja por sua própria vontade. Isso acontece quando ele conhece Sieglinde, sua alma-irmã, sua "Eva", aquele algo que ele sempre buscou e que na verdade faz parte dele.

Aqui é interessante conhecermos os estudos de Annick de Souzenelle, que diz que "Eva" foi atribuida ao conceito de mulher, enquanto divisão dos sexos; porém assim como o nome Eva (em hebreu Ishah) significa costela, significa também lado. Eva foi "feita" do "lado" de Adão, porém sendo ela mesma uma representação do outro lado de Adão, sendo o lado feminino dos pólos feminino e masculino do ser humano. Partindo desse principio, buscar a "alma gêmea", simbolicamente, representa primeiramente uma união em si mesmo para nos tornarmos seres completos.

Sieglinde e Siegmund são irmão gêmeos. Eles cresceram separados e agora estão prontos para esse rencontro, essa união em si mesmos, onde, só depois de tornarem-se este “Ser completo” podem gerar um outro ser, também completo; esse sim, livre. Assim temos Siegfried.

Essa união acontece em uma noite muito especial, no momento do Equinocio da Primavera que se dá justamente no início da Primavera (no hemisfério norte), momento que o sol cruza o equador e começa a ascender no hemisfério norte, que a duração do dia e da noite são iguais, de 12 horas (equilibrio entre dia e noite, entre luz e sombra). Neste momento o Sol deixa o aquoso signo de Peixes, que é também feminino e dócil, pelo marcial vigoroso e ígneo signo de Áries, o carneiro ou cordeiro, onde é exaltado em poder. É o momento onde a terra revigora-se, a natureza ganha seu verde, os animais procriam e os seres humanos podem desfrutar de uma energia incrível.

Momento propício para grandes seres incarnarem e realizarem um trabalho de eleveção vibratória na Terra, momento da concepção do nosso herói Siegfried, aquele que através da vitoria ganha a paz, que traz as carateristicas dos signos de Peixes e Áries, que será também o cordeiro sacrificial que libertará os deuses e proporcionará um novo recomeço.

Finalizemos com o poesia que responde Sieglinde, falando desse casamento mistico.

"Du bist der Lenz,
Tu és a Primavera,

nach dem ich verlangte

por quem ansiei

in frostigen Winters Frist.

no frígido tempo do inverno
.
Dich grüßte mein Herz

Saudou-te o meu coração,

mit heiligen Grau’n,

com temor sacral,

als dein Blick zuerst mir erblühte.

quando teu olhar
pela primeira vez me despertou. Fremdes nur sah ich von je,
Só estranhos antes eu via,

freundlos war mir das Nahe;

envolta por uma cercania sem amigos;

als hätt’ ich nie es gekannt,

como formas que eu jamais conhecera,

war, was immer mir kam.

era tudo o que me sempre vinha.

Doch dich kannt’ ich

Mas a ti eu identifiquei

deutlich und klar:

com nitidez e clareza:

als mein Auge dich sah,

assim que meus olhos te viram,

warst du mein Eigen;

te tornaste meu;
was im Busen ich barg,

o que eu guardava no peito,

was ich bin,

o que eu sou,

hell wie der Tag

claro como o dia

taucht’ es mir auf,

emergiu de mim,

wie tönender Schall

qual sonante eco

schlug’s an mein Ohr,

batendo em meus ouvidos,

als in frostig öder Fremde

quando, em meio à fria e deserta estranheza,

zuerst ich den Freund ersah.

vi pela primeira vez o amigo.
"

(meus especiais agradecimentos ao site "Wagner em portugues", pela bela tradução do libreto)

Mergulhando no coração da Waltraud... com Daniel Barenboim.


Após a leitura apaixonante do livro de Daniel Barenboim, “A música desperta o tempo”, não poderia deixar de compartilhar com vocês um trecho muito emocionante que ele escreveu a propósito da nossa querida Waltraud…

Falava a propósito da Orquestra West-East Divan, onde eles discutiam a possibilidade de tocar Wagner ou não. Decidiram tocá-lo, e lá é melhor mergulhamos nas palavras do prórpio Daniel…

“… No verão seguinte, Waltraud Meier estava conosco em Pilas, para participar nas atividades e repetir a Nona Sinfonia de Beethoven, que cantou conosco cinco vezes este verão. A tarde após a sua chegada, a pedi de aquecer a sua voz antes da repetição com orquestra porque tínhamos uma surpresa para ela. Ela pensava ouvir a repetição da Primeira Sinfonia de Brahms, igualmente ao programa da nossa turnê de concertos, e estava difícil de ela conter a sua curiosidade. Quando ela ouviu o início do Prelúdio de Tristan und Isolde, visivelmente ficou comovida; e, enquanto que a sala de repetição estava cheia de visitantes que se interessavam ao programa, para além de alguns jornalistas - que formavam uma espécie de público -, ela virou-lhes as costas, e olhando de frente para a orquestra, começou a cantar o Liebestod. Todos - Waltraud, a orquestra e eu – ficamos muito comovidos com a experiência. Viver a experiência de ouvir essa maravilhosa cantora alemã, comunicar com Árabes e Israelianos através da música de Wagner, foi como uma libertação da influência de tantos espíritos opressores, de tanto tabus. ”

As palavras de Daniel Barenboim tocam-me muito e proporciona-nos também a possibilidade de mergulhar um pouco no coração da Waltraud Meier… onde podemos descobrir alguém muito sensível, simples, que não tem medo de se doar, pelo contrário, doa-se com toda a força e amor da sua alma.


Obrigada Daniel Baremboim pelo seu maravilhoso livro!